Não faleis. Estai alerta, estes dias as paredes
escutam. Não muito longe da conversa e a fofoca está a traição.
A criação é a
liberdade do escravo!
Após anos dizendo, em muitas ocasiões sem
filtro, tudo o que me vinha repentinamente á cabeça, tomei a decisão de calar. Nos
últimos tempos não é que aprendera a estar calado, simplesmente guardei
silêncio porque a distância desenvolve a paciência, essa forma demorada de
gerir as idéias. Com ela, a importância dos acontecimentos se relativiza, e se
aceita incluso a morte do que se amara porque, enquanto um vive, nada morre em
verdade.
O motivo, então, para escrever estas linhas é
falar do exílio, dessa distância que se procura pela incompreensão de tudo o
que se passa ao redor de um mesmo, pelas distintas formas de ver o mundo que vão
definindo as margens. Dizia Vicente Araguas, a quem agradeço sempre as suas amáveis
palavras, ao respeito do meu último livro, 1[14]1 (Belagua. 2019), que eu
deslocara-me ás margens da poesia galega. Concordando em parte com a sua
sentença, devo matizar uma cousinha. Em realidade, tomei distancia mas não criei
as margens, eu fui colocado lá para ficar. As margens foram criadas por um ente
indefinido composto por todas as pessoas que de algum jeito decidiram partilhar
o mesmo, ou semelhante, interesse pela cultura e, nomeadamente, pela literatura
galega. Infelizmente, entender que deve existir um cânone e, em conseqüência, um
establishment, uma elite que respeita e defende esse preceito, deixa fora do
jogo a todas aquelas pessoas que, com erros e acertos, decidíramos tomar a via
da experimentação, em nome, principalmente, da diversidade. Como todos os entes
que conseguem ter vida própria, buscam sempre sobreviver, e para isso é preciso
criar um lobby que defenda políticas de tupperware,
é dizer, fechadas e opacas. Na Galiza temos exemplos de entidades deste tipo,
das que sempre se destaca a necessidade de que existam, ainda quando nunca está
claro que é o que elas fazem de bom, ou mesmo o motivo pelo que são necessárias.
Não importa se elas cumprem ou não o seu cometido, importa que se repita
insistentemente que são importantes para conseguir determinado objetivo. O medo
a contaminação do cânone produze uma separação das entidades com respeito á população.
Essa ausência faz que uma maioria perda o interesse por estas entidades, pelo
que o establishment tem outro motivo para fechar-se no seu hermetismo natural.
O pior problema, ao meu modo de ver, é quando se relacionam políticas
culturais, por meio das entidades das que venho de falar, que se afastam da
cultura, com os interesses econômicos de empresas que pretendem viver também deste
eido. Essa amálgama é capaz de modificar o cânone, para que ele serva para
vender mais livros. Evidentemente, é preciso que existam criadores e criadoras
de cultura que queiram participar desse establishment, para criar e espalhar o
cânone em nome duma cultura á que dizem representar, mas que simplesmente
defende os interesses do lobby conformado por entidades vinculadas á cultura e
pelas empresas ligadas também ao sector.
O problema que eu vejo é que criar um cânone
para vender livros, afastou definitivamente á população de certos âmbitos da
literatura galega. Gerando um mercado que engloba a todas essas pessoas que,
obrigadas a consumir, ainda não têm capacidade para afastar-se por completo.
Num país como o galego, a criação dum establishment é outra forma de exílio,
fazendo que aquelas pessoas que ficamos nas margens sejamos os excluídos
daqueles que já criaram distância com aquela maioria da população para a cal o
mundo da literatura é já, de em por si, irrelevante ou, quando menos, não prioritário.
Pelo que deveria dizer que as margens são o exílio
definido pelo establishment literário galego, exilado também ele do conjunto da
sociedade. Pero o que realmente deveríamos pensar, em minha opinião, é se
realmente as superestruturas culturais fazem sentido ou se a cultura pode ser construída,
já não desde as margens, senão desde uma posição onde as margens não façam
sentido?
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